quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O senhor chato




O chato é aquele que reclama com razão,

Porém, mesmo sem tê-la, esbraveja por algum motivo.

Presente em todos os setores da sociedade, no futebol é reconhecido de longe.

Dentro ou fora das quatro linhas.

No campo, é aquele que xinga o juiz, apela com o adversário, insulta a mãe alheia e se sente dono da razão.

Na arquibancada, torce pelo pior time do mundo, ninguém joga nada e só ele sabe a mágica solução.

O esporte dele, mesmo, é reclamar.

O gramado é ruim, a torcida não apoia, o time não faz gol e só ele para perder tempo em assistir.

O estádio está cheio, nada confortável e ele não sabe o que faz ali.

Chama o técnico de burro, o presidente de ladrão, o goleiro de frangueiro e o atacante de amarelão.

Olha no relógio, o tempo passa rápido, o placar não muda e sai dali frustrado.

Quer voltar para casa, o ônibus não passa, o ponto está lotado e lá vem o velho atraso.

Vêm os pensamentos, a insatisfação, o arrependimento e a reclamação.

Ao chegar na residência, a mulher só enche o saco, os filhos só atentam e a sogra veio visitar.

É final de mês, o salário não caiu, hoje não tem janta e o jeito é descansar.

A televisão quebrou, o rádio não funciona, o sofá não presta e o chuveiro não pôde ser trocado.

Quer fugir do mundo, viver isolado, não pensar em nada e ser um aposentado.

Acorda para a realidade, pensa na segunda-feira, nas suas responsabilidades e olha para o lado.

Ora bolas, com essa vida era melhor ter ficado no estádio!

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

O sonho, o apito e o domingo


imagem: divulgação


O relógio badala seis vezes

O domingo, como os demais, começara cedo

O uniforme, a postos, está pronto, desde sempre, para ser usado.

A bola, ao lado da cama, fora colocada minuciosamente no dia anterior.

Camiseta, calção, caneleira e a chuteira deixam de ser instrumentos de caracterização e passam a compor uma liturgia quase divina.

O jejum, pelo esforço físico que está por vir, será mantido até o fim do duelo.

O alongamento e o bocejo vêm acompanhados num mesmo diapasão.

O aquecimento é feito logo ali, no seu vestiário particular: o apertado espaço entre a sala e a cozinha.

Já vestido e com a pelota debaixo do braço, um beijo na testa da esposa, que ainda dorme, anuncia o"até logo”.

No caminho, a imaginação vai longe.

Do campinho de terra batida aos maiores templos do ludopédio mundial

Lembra dos craques, dos gênios e dos ídolos.

Imagina jogadas, gols e comemorações

Quando chega ao lugar reservado ao seu espetáculo, a saudação é muito bem vinda

É verdade que muito mais pela pelota do que por sua presença.

Dono da bola é também dono do jogo.

As equipes são, com muito esmero, selecionadas.

E, para seu azar, não faltara ninguém.

Sequer vaga no gol, posição mais do que aviltada no futebol de várzea, tinha.

Restou-lhe, somente, o apito.

Mais uma vez voltará para casa sem ser elogiado.

No máximo, ouvirá algumas palavras de baixo calão dirigidas a ele e a sua genitora.

O sonho de marcar um golaço, de novo, fora adiado.

Quem sabe, se tiver sorte, para o domingo que vem.