terça-feira, 11 de outubro de 2011

Histórias de um Fla x Flu


imagem: Paulo Wrencher


Nelson Rodrigues disse, certa vez, que o Fla x Flu surgiu 40 minutos antes do nada. O clássico do último domingo, para mim, se iniciou há alguns meses. Começou num diálogo entre dois sujeitos que resolveram se enveredar por algo em extinção, o caminho das crônicas, da literatura, do romantismo e da boêmia, tão presentes em décadas atrás, mas que, hoje, foram ultrapassados por atributos pertencentes a um mundo cada vez mais voltado para a velocidade, para a técnica e tudo que ambos, de certa maneira, têm aversão.

Agora, ponha-se em meu lugar. Imagine você, aos 23 anos, estudante de jornalismo, acompanhado do seu melhor amigo, a quem pregou a alcunha de Maior Irmão Disparado, na cidade maravilhosa, para estudar os gênios da raça Mário Filho e Nelson Rodrigues, tomar um sol, degustar algumas bebidas, aproveitar a noite carioca e assistir um clássico da estirpe de um Flamengo x Fluminense. Acrescente a isso o começo da realização de um sonho, no qual o intuito é relatar as maiores tragédias dos rivais da Guanabara e, antes de tudo, recuperar uma linguagem que agoniza no jornalismo esportivo, sem se importar com regras, projetos e tudo o que os dias hodiernos impõem para manter o abominável padrão.

Imaginou? Pois, insisto, ponha-se em meu lugar.

Pense em dormir em São Paulo e acordar no Rio de Janeiro, onde o tempo parece seguir o seu próprio ritmo, numa leveza e calmaria dignos de paraíso. Some o fato de o dia ter começado às 6h da matina e, após alguns minutos, você se vê num mergulho em que é possível sentir o gosto da saborosa liberdade e, nos seus olhos, a imagem do horizonte que parece infinita, numa manhã que passara na velocidade e na pausa da fala daqueles que recitam um poema para amada.

Pois bem, além de tudo isso, acima de sua cabeça, o sol, o mais eficiente dos despertadores daqueles que madrugam, reina em absoluto, num céu abençoado por um Cristo que, de braços abertos, recebe a todos com uma satisfação incólume. Já habituado, você descobre que nasceu para morar ali, mas, no instante seguinte, percebe que deixou uma vida, uma carreira, uma profissão e um sonho, que se tornara, naquele momento, pesadelo para trás. Daí, inevitavelmente, promete que um dia irá voltar. E, dessa vez, torce e deseja muito, será para ficar.

Tomados por uma imensa alegria, você e seu amigo, vão ao encontro daquilo que seria uma obrigação. Mas, convenhamos, desde quando procurar e ler crônicas dos irmãos Mário e Nelson é um fardo? Sim, meus caros, esse é o preço que se paga quando se mistura trabalho e diversão.

O tempo passa numa lentidão saborosa e os dias se vão numa alegria que se contradiz com a iminente volta. Após passar por Copabacana, parar na Biblioteca Nacional, dar um pulo na Gávea e ir à apaixonante Lapa, nos restava assistir ao mais esperado jogo, para mim, dos últimos tempos. Era a oportunidade de acompanhar as duas torcidas de perto, sentir suas emoções e se inspirar para o que vem pela frente: escrever.

Portanto, indago-lhes se isso não é felicidade, pois se não for, nem quero que me apresentem a ela.

O domingo começa cedo. O mar, o clima e o calçadão eram convites à inspiração. E daí se explica o porquê do surgimento de tantos gênios das letras no lugar que é sinônimo de perfeição. Com a maioria dos deveres cumpridos, os garotos partem ao Engenhão para o clássico. No caminho, até o que deveria ser normal espanta. Torcedores de Flamengo e Fluminense indo ao estádio, lado a lado, em extrema harmonia, com gozação, sem violência e com admirável respeito.

Já no estádio, o espetáculo das torcidas é inigualável. Quando os escretes sobem ao gramado, uma energia toma conta e os gritos das nações parecem ecoar pela cidade, pelo estado e por todo o Brasil.

Na arquibancada, os amigos assistem, impactados, o conjunto de fatores que tem tudo para terminar em uma obra prima. Do céu, os irmãos Nelson Rodrigues e Mário Filho se sentam, um junto do outro, para acompanharem a partida que, por anos, fora a mola propulsora de seus incontáveis e incomparáveis textos. A magia presente, parte dos objetivos realizados e a manutenção de um sonho que, como todos os outros que envolvem os meninos, dará certo no final.

E se o primeiro tempo valeu pelo show proporcionado nas arquibancadas, nas quais a torcida do Fluminense, com o tradicional pó de arroz e a do Flamengo, com os cantos que fazem parte da história do clube, ensinavam o que é torcer e vibrar de verdade, a segunda etapa reservaria uma benção divina. O Cristo Redentor, imponente, a tudo acompanhava. Já os deuses do futebol entraram em campo e fizeram daquele jogo histórico, com o time de Nelson Rodrigues jogando melhor, em vantagem no placar por duas vezes e com o rival, time de Mário Filho, valente, embalado pelo som, uníssono, que surgia a cada ataque, “Oh, meu Mengão, eu gosto de você. Quero cantar ao mundo inteiro a alegria de ser rubro-negro. Vamos para cima, Mengão. Acima de tudo rubro-negro”. A sintonia time-torcida passou a existir e o que se viu foi uma virada, nos minutos finais, do jeito que o flamenguista gosta, épica. A energia era encantadora.

Ao fim da partida, enquanto Danilo e eu éramos, somente, alegria por tudo que vemos e vivemos, lá de cima, Mário Filho, ao lado do irmão, Nelson Rodrigues, era só sorrisos. Assim, como a maioria do Brasil.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Próxima parada: Rio de Janeiro

imagem: divulgação
Meio intelectual, meio de esquerda, como disse o gênio da espécie Antonio Prata,

Não sou muito fã de praticidade, rapidez e comodidade,

Pra ser sincero, tenho certa aversão a tudo que é oferecido pelo tal mundo moderno.

Mesmo assim, meio solitário, consigo encontrar seres que se identificam com os meus devaneios.

E assim, meio intelectual e meio de esquerda, parto para o Rio de Janeiro portando uma mochila nas costas, algumas ideias na cabeça e acompanhado do maluco mais lúcido que conheço.

Ah, e de ônibus, transporte que tem a cara do povo.

Avante, Danilo Quintal.